Frequentemente ensino as pessoas a entregar completamente as suas aflições a Deus. O que quero dizer é que, independentemente do que ocorra, não devem se preocupar. Parece algo simples que conseguimos realizar sem nenhuma dificuldade, mas na realidade não o é. Eu mesmo, quando me vejo nessa situação, faço um grande esforço para entregar tudo a Deus; entretanto, as preocupações começam a me rondar. Afinal, neste mundo cheio de perversidade, é quase impossível conseguir isso. Por outro lado, a pessoa de fé é diferente das demais: tão logo lhe surge uma preocupação, lembra-se de entregá-la a Deus e sente grande alívio.
Gostaria de salientar um ponto que as pessoas não percebem. Se interpretarmos espiritualmente, veremos que o pensamento [sonen] de preocupar-se é uma espécie de apego. Ou seja, o apego à preocupação é como um mal que influencia negativamente todas as coisas.
Geralmente, quando se fala em apego, pensa-se no apego que se liga ao desejo de ter sucesso, de obter dinheiro, de viver no luxo e de satisfazer todas as vontades. Há, ainda, outro tipo de apego, de caráter maligno, que se manifesta em desejos como: “Aquele sujeito é um insolente, um atrevido, e eu o odeio! Vou lhe dar uma boa lição.”
Entretanto, o apego ao qual me refiro não é aquele tão óbvio. É um apego que geralmente passa despercebido. Trata- se da preocupação com o presente ou da ansiedade excessiva. Refiro-me também ao sofrimento pelo que ficou no passado. Quando se trata de um fiel, embora Deus queira conceder-lhe graças, o apego acaba formando espiritualmente um obstáculo e, quanto mais forte ele for, mais fraca é a proteção divina e, por esse motivo, as coisas não correm a contento.
Um bom exemplo disso é que, à proporção que se deseja muito alguma coisa, mais difícil é consegui-la. Qualquer um já teve a experiência de ver concretizar seu desejo quando já tinha desistido dele.
Às vezes, quando almejamos muito fazer isso ou aquilo, nada se concretiza. No entanto, esse desejo se realiza quando já o tivermos esquecido.
Na prática do Johrei, dá-se o mesmo. À medida que a vontade do ministrante de curar alguém se intensifica, fazendo- o pensar: “Quero curá-lo de qualquer maneira”, o restabelecimento será mais demorado. Entretanto, quando o Johrei é ministrado com desprendimento ou até mesmo com um pouco de dúvida: “Não sei se esta pessoa se restabelecerá ou não, mas em todo caso vou ministrar-lhe Johrei”, para surpresa geral, o doente se recupera mais facilmente.
Em outra situação, apesar de os familiares e amigos próximos ansiarem pela cura, o doente em estado grave que parecia estar se recuperando, não se restabelece e, muitas vezes, acaba morrendo. Ao contrário, observa-se que a recuperação advém de forma relativamente fácil e rápida, quando o enfermo fica um tanto indiferente ante a ideia da vida e da morte, e seus familiares parecem não se preocupar muito.
Temos, ainda, casos de doentes e seus familiares que de- sejam a salvação a todo custo. Contudo, a doença se agrava, até chegar ao ponto em que, ante a perspectiva do inevitável desenlace, todos acabam desistindo. É então que sobrevêm melhoras rápidas, e firma-se a cura. É um fato curioso, mas há enfermos que insistem, dizendo: “Não posso morrer com uma doença tão simples como essa. Mostrarei que sou capaz de curá-la pela minha força mental.” Geralmente, tais pessoas acabam morrendo, e a causa principal está no apego à vida
Creio que puderam compreender, por meio desses exemplos, quão pavoroso é o apego.
Assim sendo, em casos de doentes sem qualquer chance de salvação, primeiramente deve-se deixar subtendida a improbabilidade de cura e dizer que rogaremos a Deus que lhes conceda a salvação no Mundo Espiritual. É bom deixá-los bem cientes disso, bem como comunicar os familiares. A partir de então, com a ministração de Johrei, muitas vezes, o estado de saúde começa a melhorar.
Embora o assunto seja diferente, constatamos que situação semelhante se manifesta no relacionamento entre pessoas de sexos opostos. O demasiado interesse de uma pode afastar a outra, causando-lhe repulsa. Pode parecer extremamente irónico, mas é o apego de um que esfria o coração do outro. Aliás, os factos deste mundo, na sua maioria, têm, realmente, caráter irónico. Por esse motivo, são complicados e também interessantes.
Pelo exposto, creio que puderam compreender que quase sempre o apego é a causa do insucesso. É nesse sentido que digo frequentemente para visarem ao efeito contrário: é a ironia das ironias, mas é a pura verdade.
Jornal Eiko no 132, 28 de novembro de 1951
Alicerce do Paraíso vol. 4